sábado, 16 de maio de 2015


"...Acendeu um cigarro, revirou a cabeça e fez um círculo com o fumo do cigarro.
- Em breve estaremos no Novo Mundo... The New World... Mas como diz Casterade, não devemos esquecer a velha França...
No momento, não prestei grande atenção àquela observação do meu pai.
Só agora, passados tantos anos, julgo ouvi-la claramente e compreendê-la, como se voltasse a ser a criança daquela noite, sentada no banco do pequeno jardim do São Vicente de Paulo.
Penso muitas vezes na minha escola, na Rua des Petits-Hôtels, nesse pequeno jardim onde brincava com os meus colegas, nas tardes poeirentas de verão, no nosso armazém e na balança em que eu e o meu pai nos pesávamos. Penso no senhor Casterade a ler-nos os seus poemas. E tambèm na senhora Dismailova, cuja verdadeira voz nunca ouvi.
Afinal somos sempre os mesmos, e aquilo que fomos no passado permanece connosco até ao fim. Por isso, haverá sempre uma rapariguinha chamada Catherine Certidude que continuará a passear com o seu pai pelas ruas do X.º bairro, em Paris."
"A História de Catherine" de Patrick Modiano, com ilustrações de Sempé,  Editorial Presença, Barcarena, 2014, pág. 91.